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Os dois filhos perdidos e o caminho de Jesus


A famosa parábola do filho pródigo que está em Lucas 15 é uma peça em dois atos; o primeiro ato se chama “O Filho Perdido Mais Novo”(filho pródigo), e o segundo ato, “O Filho Perdido Mais Velho”. Seria melhor dar a essa história de Jesus o título “Os Dois Filhos Perdidos”.

A maior parte das interpretações dessa parábola concentra-se na saída e na volta do irmão mais novo — o “filho pródigo”. No entanto, essa abordagem não reflete a verdadeira mensagem da história, pois ela nos apresenta dois irmãos, e cada um simboliza um modo diferente de nos alienarmos de Deus e de tentarmos ser aceitos no reino do céu.

Portanto, a quem se dirige o ensino de Jesus nesta parábola? Aos escribas e fariseus. Jesus começa a lhes contar a história motivado pela postura deles. A parábola dos dois filhos estende o olhar à alma do irmão mais velho e culmina em um forte apelo para que ele mude a postura de seu coração.

Ao longo dos séculos, sempre que esse texto foi ensinado, o foco esteve dirigido quase exclusivamente ao modo de o pai acolher seu filho mais novo arrependido, mostrando o amor incondicional de Deus e sua misericórdia infinita. Mas raramente ensinavam sobre o filho mais velho.

A história é dirigida não a “pecadores rebeldes”, mas a pessoas religiosas que fazem tudo o que a Bíblia manda. Jesus não está argumentando com gente imoral que não fazia parte da esfera religiosa, mas com religiosos afeitos à moral. Ele está querendo lhes mostrar que são cegos, bitolados e cheios de justiça própria; essas características estão destruindo sua alma e a alma das pessoas que os cercam.

Com essa parábola, Jesus desafia o que praticamente todos nós pensamos sobre Deus, pecado e salvação. A história revela o egoísmo destruidor do irmão mais novo, mas também condena com todas as letras a vida moralista do irmão mais velho. Jesus está dizendo que ambos religiosos e não religiosos estão espiritualmente perdidos, andando por caminhos na vida que levam a becos sem saída, e que todos os pensamentos da raça humana sobre como se relacionar com Deus estão errados.

Hoje estamos vivendo uma busca da espiritualidade como remédio para a falta de proposito e sentido da vida. Entretanto até a própria neurociência está com uma infinidade de pesquisas sobre o desenvolvimento deste setor na mente humana capaz de trazer felicidade , liberdade e paz de espirito. Entretanto existe um fenômeno acontecendo nesta busca, que é um número crescente dos chamados “desigrejados”, ou seja, pessoas que buscam a espiritualidade sem ir à igreja tradicional.

Isso deve-se a uma questão a ser respondida: Por que as pessoas gostam de Jesus, mas não da religião?

Nos dias atuais, também convivemos com irmãos mais velhos e irmãos mais novos dentro da mesma sociedade e muitas vezes na mesma família. Geralmente o irmão mais velho na família é aquele que se preocupa em agradar pai e mãe, o filho responsável que vive segundo os padrões estabelecidos pelos pais. O irmão mais novo tem a tendência de ser rebelde, de não se preocupar com regras e de preferir a companhia e a admiração dos amigos. O filho mais velho cresce, arruma um emprego tradicional e mora perto do pai e da mãe, ao passo que o filho mais novo vai embora para morar na cidade grande.

Temos então dois filhos , o filho mais novo que é o “mundano” e o filho mais velho que é o “moralista”. Esses são os dois caminhos que o ser humano acaba escolhendo. E para Jesus, qual dos dois é o caminho correto? Nenhum dos dois, para Jesus , os dois estão perdidos. Ele não está do lado do não religioso nem do religioso, mas dá destaque ao moralismo da religião como uma doença espiritual particularmente fatal.

A ideia central é que, de modo geral, as pessoas que podiam ser consideradas religiosas praticantes escandalizavam-se com Jesus, ao passo que as alienadas das práticas morais e religiosas ficavam fascinadas e se sentiam atraídas por ele. Essa realidade pode ser contemplada nos relatos da vida de Jesus apresentados pelo Novo Testamento. Em todos os casos em que ele se encontra com uma pessoa religiosa e uma vítima de discriminação por causa do sexo (como em Lucas 7), ou com alguém religioso e alguém discriminado por motivos raciais (como em João 3 e 4), ou com

uma pessoa religiosa e outra discriminada por razões políticas (como em Lucas 19), quem se liga a Jesus é a pessoa discriminada e não aquela simbolizada pelo irmão mais velho. Jesus diz aos respeitáveis líderes religiosos: “… os coletores de impostos e as prostitutas entrarão no reino antes de vocês” (Mt 21.31).

O filho mais novo na parábola pede a herança do pai e vai para um lugar distante. Gasta todo o dinheiro irresponsavelmente e acaba tendo que trabalhar dando comida aos porcos (lembro que os porcos era considerado animal impuro para os judeus). Lembrando que os funcionários de seu pai tinha o que comer e onde dormir ele traça um plana para retornar a sua casa pedindo para apenas ser um funcionário mas não um filho , Entretanto quando ele volta é recebido com abraço e beijo pelo seu pai que pede para colocar roupa nova , sandálias e anel e promove uma festa. O pai na parábola representa Deus , sempre com coração aberto a nos receber. Entretanto o filho mais velho não gosta do que vê, fica furioso e vai reclamar com o pai e diz : “esse seu filho gastou todo o dinheiro com prostitutas e você oferece uma festa para ele e eu que fiquei aqui trabalhando e seguindo todas as regras , você não deu nem um cabrito para eu comer com meus amigos?. O filho mais velho se recusa a participar da festa!!

No primeiro ato, na pessoa do irmão mais novo, Jesus pinta um retrato do pecado que qualquer um pode reconhecer. Aquele jovem é motivo de humilhação para a família e leva uma vida dissoluta e voltada aos prazeres pessoais. Ele está totalmente fora de si. Está alienado do pai, personagem que representa Deus. Qualquer pessoa que vivesse daquele jeito seria rejeitada por Deus, conforme haveriam de concordar todos os ouvintes da parábola. No segundo ato, porém, o holofote se volta para o irmão mais velho. Ele presta obediência meticulosa ao pai e, portanto, por analogia, aos mandamentos de Deus. Exerce total controle sobre si e se revela bastante disciplinado. Vemos então dois filhos: um é considerado “mau” segundo os padrões tradicionais, e o outro é tido como “bom”; mas os dois estão alienados do pai. O pai é obrigado a sair e convidá-los a participar da celebração de seu amor. Assim, a parábola não retrata somente um filho perdido, mas dois. Mas o segundo ato tem um desfecho que não poderíamos imaginar. Ao contar a história, Jesus deixa deliberadamente o irmão mais velho em seu estado de distanciamento. O filho mau entra para o banquete do pai, mas o bom fica do lado de fora. Aquele que buscou a companhia de prostitutas é salvo, mas o homem cheio de retidão moral continua perdido. É possível imaginar os fariseus (representando os religiosos) bufando de raiva no fim da história. Tudo aquilo era exatamente o contrário do que eles sempre tinham ouvido.

O que impedia este filho mais velho a participar do banquete? Qual era o problema?

O que deixou o irmão mais velho fora do banquete da "salvação" foi seu orgulho por causa do que ele fazia de bom, não algum remorso por algo de mau que ele tivesse feito. O problema do irmão mais velho está em sua justiça própria, no modo que ele apela às suas realizações morais a fim de colocar Deus e os outros na condição de devedores, controlá-los e levá-los a fazer o que ele deseja. Seu problema espiritual está na profunda insegurança derivada do fato de que ele baseia sua autoimagem em suas realizações e em seu desempenho, de modo que seu sentimento de justiça sempre precisará ser sustentado acusando e rebaixando os outros.

Os irmãos mais velhos são incapazes de lidar com o sofrimento, e essa incapacidade é consequência do fato de que eles esperam resultados de sua observância das regras. Eles vivem uma vida pautada pela moral não porque têm prazer nas virtudes em si, mas porque desejam controlar as circunstâncias da vida.

Os irmãos mais velhos baseiam sua autoimagem no trabalho árduo, na retidão moral ou no fato de serem membros de um grupo de elite, ou de se acharem extremamente inteligentes e espertos. Essa postura leva a um sentimento de superioridade em relação às pessoas que não têm as mesmas qualidades. Aliás, é principalmente por meio da comparação competitiva que os irmãos mais velhos alimentam seu senso de importância pessoal. Racismo e preconceito de classe não passam de versões diferentes desse projeto de salvação pessoal. Essa dinâmica ganha mais força quando os irmãos mais velhos se orgulham de professar uma religião superior à de todos os outros. Se um grupo acredita que Deus os favorece em consequência de uma doutrina especial, por causa do culto que lhe oferecem e em virtude de certos comportamentos éticos, a postura que esse grupo assumirá diante dos que não têm essas qualidades pode ser hostil. Eles têm uma justiça própria que se esgueira sob a alegação de que estão apenas fazendo oposição aos inimigos de Deus. Quando olhamos para o mundo através dessas lentes, fica fácil justificar o ódio e a opressão perpetrados “em nome da verdade”.

A justiça própria dos irmãos mais velhos, além de dar origem ao racismo e ao preconceito de classe, cria no plano pessoal um espírito que julga e se nega a conceder perdão. O irmão mais velho da parábola não consegue perdoar o irmão mais novo porque este enfraqueceu a posição da família na sociedade, desonrou seu nome e dilapidou suas riquezas. Ele enfatiza que o irmão mais novo andava com “prostitutas” enquanto ele vivia uma vida pura dentro de casa. “Eu jamais chegaria a esse nível de maldade!”, é o que seu coração está dizendo. Como ele não se considera parte de uma comunidade de pecadores, fica preso na armadilha de sua própria amargura. É impossível perdoar uma pessoa se você se sente superior a ela.

A essência da diferença entre um fariseu e alguém que crê em Jesus está na motivação que se encontra no fundo do coração. Os fariseus podem ser bons, mas o que os move é a necessidade de controlar a Deus, uma necessidade cuja força motriz está no medo. A verdade é que eles não confiam em Deus nem o amam. Para eles, Deus é um chefe exigente, não um pai amoroso.

O Moralismo não cura o ser humano interiormente. Ele é muito bom para a sociedade e comunidade religiosa “externamente”, é como uma embalagem que não deixa mostrar o que está por dentro. O moralismo não resolve nosso egoísmo , ganância , inveja , ira , ansiedade , medo , enfim continuamos doentes apesar de que por fora parecemos pessoas extremamente corretas.

A verdadeiro Evangelho é um terceiro caminho mostrado por Jesus , onde o humilde está dentro e o orgulhoso está fora. "Pois todo o que se exalta será humilhado, e o que se humilha será exaltado"(Lucas 14.11).

Somente este terceiro caminho será capaz de preencher este vazio existencial , promover a cura interior e nos contemplar com o propósito e sentido da vida.

Inspirado no livro de Timothy Keller, O Deus pródigo.

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